21 janeiro 2025

Por que nos tornamos chatos ao aprender algo novo?

Quero começar falando sobre MBTI. Você, muito provavelmente, já ouviu falar sobre né. Se não, MBTI é um teste de personalidade que a maioria das pessoas faz no 16Personalities, e você pode obter um entre 16 resultados, como ISFJ, ENTP, INTJ e vários outros…

Bom, você sabia que MBTI foi desenvolvido por uma tal de Katharine e sua filha, e que elas se basearam em uma teoria do Carl Jung? Isso foi na época da Segunda Guerra Mundial, e elas pensaram que seria um bom modo de direcionar as pessoas pra ocupações mais adequadas de acordo com suas preferências psicológicas. Mas não sei dizer até onde ou se funcionou.

A questão é que a teoria do Jung é bem mais detalhada do que a teoria do MBTI. O que mãe e filha fizeram não foi bem desenvolver uma teoria; elas só simplificaram o que Jung disse. Elas não expandiram a teoria com novas ideias ou pesquisas. Em vez disso, pegaram os conceitos básicos e reorganizaram pra um modelo mais comercial e prático.

Tá, mas então como cada teoria funciona?

Jung analisava a personalidade das pessoas usando funções cognitivas. Não vou me prolongar e falar sobre todas aqui (são oito no total), mas um exemplo de função cognitiva pode ser a de Julgamento, que é como tomamos decisões. Dentro disso, temos Te (Pensamento Extrovertido), que se baseia na lógica objetiva e na eficiência externa; Ti (Pensamento Introvertido), que analisa conceitos internamente para encontrar coerência lógica; Fe (Sentimento Extrovertido), que valoriza harmonia e o impacto emocional no ambiente externo; e Fi (Sentimento Introvertido), que se baseia em valores pessoais internos para tomar decisões.

Cada pessoa tem uma função dominante, que é a mais natural e usada com mais frequência. As outras funções (auxiliar, terciária e inferior) desempenham papéis complementares, mas são menos desenvolvidas.

Pra determinar o seu tipo, você precisa basicamente ler sobre as funções cognitivas e identificar o que mais reflete quem você é. No meu caso, eu sou ISTP, e minhas funções são Ti-Se-Ni-Fe, respectivamente. Ti é a minha dominante, e isso significa que essa é a minha principal forma de pensar. Resumindo, eu avalio as coisas com base na minha lógica interna e busco coerência em tudo. Enquanto isso, Fe, que é o oposto de Ti, é a minha função inferior. Isso significa que essa é a minha função menos desenvolvida, e eu tenho dificuldade em lidar com a harmonia social e as emoções dos outros.

Cada tipo tem as suas funções, e cada uma delas segue uma lógica, uma ordem e tem uma explicação dependendo da posição em que ela está.

Complicado? Um pouco. Foi exatamente o que a Katharine e a filha dela pensaram. Por isso, elas decidiram pegar todo esse conceito criado por Jung e simplificar. Em vez de analisar alguém com oito funções cognitivas, elas analisam por:

  • Introversão (I) vs. Extroversão (E)
  • Intuição (N) vs. Sensação (S)
  • Pensamento (T) vs. Sentimento (F)
  • Julgamento (J) vs. Percepção (P)

E nesse caso é beeem mais fácil. Você só precisa escolher a letra que mais diz sobre você. Ou seja, se você se percebe como extrovertido, vai pela intuição, é mais sentimento e gosta de planejar, por exemplo, você é ENFJ. Mas, lembrando que isso é de acordo com o sistema MBTI criado pela Katharine e sua filha. Se você usar ENFJ na teoria de Jung (Fe-Ni-Se-Ti), vai ler uma análise totalmente diferente e pode acabar não se identificando.

Agora, um plot-twist: tudo isso é considero como pseudociência (°ロ°) ! Sim, tanto a teoria complexa de Jung quanto a versão simplificada da Katharine e sua filha são pseudociências. Mas por quê? Ciência usa dados e fatos. Logo, pra uma teoria ser ciência de verdade, é preciso fazer testes e experimentos, e, no caso do Jung, a teoria tem como base a opinião e observação dele.

Só que ser uma pseudociência não necessariamente invalida a teoria. Embora seja considerada assim no contexto acadêmico-científico, a teoria de Jung pode ser uma ferramenta útil em psicologia e no autoconhecimento.

De qualquer forma, na pandemia, em 2020, eu fiquei vidrada nesse assunto e passava horas e horas estudando, lendo e falando sobre MBTI “de verdade”. Fazia inúmeros tweets reclamando do site 16Personalities, falando como ele era um desserviço pro estudo de tipos psicológicos e que, se as pessoas realmente quisessem descobrir o tipo delas, teriam que usar a teoria de Jung. Toda vez que eu via alguém colocar ISTJ ou qualquer outro tipo na bio, eu logo julgava e pensava: “Certeza que essa pessoa tirou isso daquele site horroroso.” Mas, hoje, quase 5 anos depois, percebo que it was not that deep.

É aí que entra o ponto desse post.

Enquanto eu tava no Twitter, vi esse print rodando a tml com pessoas julgando o tweet e quem fez ele. Mesmo que eu não vá criticar a pessoa, apaguei o user pq não quero expor ninguém de um jeito que pareça negativo. Enfim… Ler as respostas no tweet me fez refletir muito sobre como parecemos chatos e sabichões quando comentamos sobre o que estamos estudando sem que ninguém tenha perguntado antes.

Quando a gente adquire uma informação nova sobre algo, passamos a enxergar o mundo de um jeito diferente e, às vezes, destruímos o que antes era pra ser algo divertido. Analisamos de uma forma mais técnica e crítica, procurando por erros em detalhes.

Assim como no caso da pessoa do tweet, o teste de MBTI no 16Personalities perdeu a graça pra mim porque passou a ser só mais um teste do BuzzFeed, enquanto a teoria do Jung era o que eu enxergava como correto e queria que todo mundo visse da mesma forma.

Mas, gente, convenhamos: meio que foda-se, né? E daí se o teste é uma versão simplificada de uma teoria mais complexa? Deixa as pessoas se divertirem, ora bolas! Bacana que eu me propus a estudar mais a fundo, só que não é por isso que as outras pessoas têm que fazer a mesma coisa.

Não sei qual foi a intenção da moça do tweet (eu conferi os pronomes, não se preocupem). Pode ter sido um desabafo, pode ter sido aquele jeitinho mediciner de se exibir, pode ter sido só uma curiosidade sobre uma informação que ela recém aprendeu ou pode ter sido qualquer outra coisa. De qualquer forma, não podemos negar que tanto ela como eu estamos no mesmo barco.

Pensar sobre tudo isso me lembrou da Mari Krüger. Ela é bióloga (além das outras 500 profissões que a diva tem) e tá sempre viralizando nas redes sociais com seus vídeos desmistificando crenças que temos, como quando ela disse que colocar sal embaixo da língua não ajuda a subir a pressão. Vejam o conteúdo dela, é muito bom. Voltando ao assunto, me lembrou dela, porque, dos vídeos que assisti, ela quase sempre começa ou termina o vídeo pedindo desculpas por ser a pessoa chata que vai contar a verdade pra gente. Eu imagino que muita coisa deve ter perdido a graça pra ela também.

Buscar conhecimento é muito importante, ainda mais com o tanto de fake news que vimos por aí, mas tenho a impressão de que ficamos cada vez mais ranzinzas e cada vez menos tolerantes pra essas coisas bobas, como uma touca de crochê imitando o cérebro. Parece que não deixamos os outros se divertirem. É sempre um "Você sabia que..." diferente, que ninguém perguntou (o caso da Mari é diferente, btw).

Não sei se vocês lembram, mas teve uma época que o Brasil tava passando por um caos na política (quando é que não tá?) e muita gente falava sobre querer ser como os ignorantes, que não sabem de nada e parecem mais felizes, sem nenhum estresse. Embora eu não concorde muito com esse pensamento, é outro ponto que acrescenta nessa minha reflexão.

Pra finalizar, acho que preciso (precisamos) aprender que obter conhecimento pode vir acompanhado de leveza e que nem tudo precisa ser analisado e ser 100% accurate. É possível repassar informação sem acabar com a diversão dos outros e com a nossa (ᵔ◡ᵔ)

Eu não sou nenhuma especialista em psicologia ou Jung. Posso ter falado besteira porque faz muito tempo desde a última vez que estudei sobre, então pode me corrigir! Acho que não respondi à pergunta do título nesse post. De qualquer forma, não era a minha intenção. Mas, se você souber a resposta ou ter uma ideia dela, fique à vontade pra expor nos comentários.

10 comentários:

  1. Seu texto me fez lembrar um teoria que eu tenho na minha cabeça que é os estágios da militância. Tem a ver com o despertar para o conhecimento. E como no inicio a gente fica bem zangado e exigente com quem não ta na mesma vibe que a gente, então tudo é revoltante e te deixa admirado tbm, seja uma admiração com a ignorância das pessoas ou com as informações novas aprendidas. É meio o que chama hoje de ser "woke". E depois de um tempo ja habituado a militância, a gente fica meio fodaci se vc não é militante tbm. Fodaci que vc não é acurado com os fatos. É um estagio que vc ja ta tao imerso na militancia, que meio que vc nao tem pique pra quem tá começando e vira quase um conservador dentro da militancia.

    Mas enfim, isso é um resumo da minha teoria que eu nunca escrevi sobre, so pensei. E vc falando sobre aprender coisas te deixar chato, me remeteu a esse pensamento. E me fez pensar em inteligencia artificial. E como foi importante terem varias pessoas woke e militando contra a inteligencia artificial enquanto muita gente tava usando ela pra brincar de fazer seu prorpio avatar, sua prorpia foto de perfil e por ai vai. Mesmo eles sendo os chatos do rolê, enquanto tava todo mundo so se divertindo. Sei que as vezes is not that deep, mas as vezes é sim kkkkk. As vezes a gente tem que tomar cuidado com o banal. Talvez basta só escolher a melhor forma de comunicar sobre o banal para as pessoas, pra nao ser simplemente o chato estraga prazeres.

    Eu lembrei tbm de uma tirinha que um cara fez (nao me aprofundei, lembro vagamente da historia) que dizia basicamente "deixe as pessoas se divertirem com suas coisinhas". E ai essa tirinha começou a ser usada por pedofilos e pessoas de gostos duvidosos para serem validadas. Entao o artista teve que vir se pronunciar e meio que deletar o quadrinho, pq tava sendo usado para fins deturpados. Entao meio que entrando em contraponto com o que vc disse. As vezes é necessário não deixar as pessoas se divertirem e ser o chato do role que vai trazer a informação de fato, mesmo que nao tenham pedido. Mas tbm fodaci kkkkkkk

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    1. É claro que tem casos, como esses que vc citou, que ser "chato" é totalmente necessário e eu concordo com vc. É preciso ter gente "militando" pra galera não pensar que pode fazer e dizer o que quiser sem ter nenhuma consequência. Às vezes it is that deep sim. Mas, no caso do meu texto, eu quis pontuar sobre situações que não impactam ninguém de forma negativa, como o crochê do tweet ou um teste de personalidade na internet. Esse tipo de coisa não vai mudar a vida de ninguém, então não tem motivo pra ficar incomodado com a diversão alheia, entendeu?

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    2. Sim sim, é verdade, eu que acabei comentando só das exceções

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    3. Muda sim a vida com o conhecimento desse tuíte do crochê. Agora a querida vai entender quando alguém disser que o cérebro dela é lisinho kkkkkkk (por aqui quando dizem que o cérebro é liso tá chamando de burro)

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  2. Eu só fico pensando o quanto de cranioplastia tiveram que fazer para, em algum momento da humanidade, afirmarem que as rugas do cérebro são um "padrão certinho".

    Acho que estudar, conhecer as coisas, saber das coisas é válido. Tem gente que viaja, acha que as coisas são maiores do que são. E o contrário também, estuda e pensa que "ah, é só o buraco negro engolindo uns planetas lá adiante, nada de mais".

    Eu não estudei nenhuma das teorias de personalidade, mas acredito que cada personalidade tem uma raiz que pode ir para um lado ou para o outro conforme a vivência e as experiências da pessoa. Mas por fora é aquilo, né, pouco de gótica vendo Sailor Moon, um pouco de Spice Girl vendo Bersekr.

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  3. Oi Nana, tudo bem?
    Adoro ler seus textos! Primeiro, porque achei super legal essa fonte das 16 personalidades, não sabia de toda essa teoria do Jung e das formas Ti, Se, etc. Achei informativo e divertido de ler.
    Mas também entendo seu ponto de que às vezes a gente só quer se divertir, sem nenhuma grande expectativa. Acho que sentir a vibe da outra pessoa ajuda a saber quando a gente vai tagarelar sobre ou não KKKKK
    Beijos,

    Priih
    Infinitas Vidas
    Priih
    Infinitas Vidas

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    1. eita que foi com 2 links, cuidado com a burra HURUASOHAUSA

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  4. Que reflexão interessante e bem articulada! Seu texto traz um tom super acessível e pessoal, o que o torna fácil de ler e se identificar. Ele equilibra bem informações históricas e conceituais com a sua experiência pessoal e sua mudança de perspectiva sobre o tema. Isso faz com que a leitura pareça uma conversa leve, mesmo tratando de algo relativamente complexo como MBTI e funções cognitivas.

    Achei particularmente valiosa sua autocrítica em relação à fase de “sabichão” e à forma como isso pode, sem querer, tirar a leveza de assuntos que antes eram apenas divertidos para os outros. É um insight importante e muito humano, que toca no fato de que o aprendizado pode, sim, coexistir com a diversão e que ser flexível e tolerante é fundamental.

    Beijinhos ~
    https://justmegabs.blogspot.com/

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  5. Esse texto é ótimo! Eu mesma faço a linha "chata dos fatos históricos" eu sei que é chato e por isso eu me seguro bastante, me deixando livre apenas com pessoas que eu sei que acham interessante as informações não solicitadas. Em partes eu sei que é só eu 100% empolgada com história, e existe uma parte que sabe que é interessante que mais pessoas saibam da informação. Uma coisa muito louca que percebi com a experiência de fazer uma graduação, é que a gente passa a ver o mundo com outros olhos, ganhamos uma "lente" para ver o mundo que acaba sendo muito direcionada para as coisas que estudamos na faculdade. Se você faz psicologia vai ver o mundo e as pessoas de uma forma, se você faz engenharia você vai ter acesso a outras percepções, e isso molda muito as coisas. Seu texto me fez lembrar disso. Apesar de termos formas diferentes de ver o mundo, não podemos tomar nossa percepção como verdade absoluta.

    Garota do 330

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  6. Eu acho que o rolê é mais uma questão de empolgação e indignação que o conhecimento nos traz. De empolgação por achar que "UAU ISSO É INCRÍVEL TODES PRECISAM SABER" e de indignação porque "não acredito que x pessoa segue espalhando essa desinformação".
    Eu odeio o MBTI porque uma pessoa me colocou pra fazer o teste quando eu tinha uns 12 ou 13 anos e me disse que eu ERA meu resultado, e eu não tinha o direito de discordar pq "o teste é perfeito". Depois, quando fiz psicologia, passei a odiar ver as siglas nos blogs e redes sociais, porque eu aprendi que teste psicológico sério só pode ser aplicado por psicólogo e SE estiver validado pelo conselho de psicologia, e que ele é uma fotografia momentânea: sua sigla de 4 letras não vai definir a sua existência. E isso me revoltava tanto, da mesma forma que me revolta as pessoas que me dizem "nossa, você é aquariana? Ai, então você é insuportável, porque os aquarianos são frios e não ligam para os sentimentos dos outros, porque vc sempre quer ser diferentona".

    Até que eu me dei conta que sei lá, algumas pessoas botam a sigla no perfil da mesma forma que eu, que odeio astrologia, boto que sou "aquariana" nas minhas redes. Ou que as pessoas falam do teste da mesma forma que, mesmo odiando astrologia, eu adooooro brincar com os perfis dos signos numa conversa descontraída e fazer o mapa astral das pessoas na zoeira, porque eu tinha amigos doidos pelo tema e acabei aprendendo por tabela.

    O problema não é a informação, é a forma como as pessoas usam. Pra se encaixar, pra se rotular, pra ocupar um lugar x na sociedade, e é isso que me incomoda.
    Acho que a idade me ensinou. Já fui a psicóloga recém formada que adorava dar pitaco em tudo, e hoje sou a psicóloga que literalmente responde qualquer pergunta com: só respondo se me pagar, de resto, não to analisando nada nem ninguém. Acho que o conhecimento empodera, e às vezes a gente quer que todes tenham acesso, ou se revolta com o mau-uso da informação, por isso ficamos chates, sabe? hahaha!

    Mas amei a reflexão e amei saber de onde veio o teste - principalmente que foi feito por 2 mulheres. Mas odeio o jung. Não tanto a abordagem, só que ele era um cara desprezível mesmo. E a galera que curte atender pela abordagem dele geralmente tb é chata, hahaha!

    Vou aguardar a resenha do livro do André Vianco! :>

    Beijinhos :*

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